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Tag Archives: legislação

Liberdade-na-Internet

A internet está sob séria ameaça no Brasil. Não é exagero. De um lado, há novos projetos de lei propostos pela CPI dos Cibercrimes que visam ampliar o controle e cercear a liberdade de expressão e conhecimento dos internautas. Eles atualizam uma mentalidade securitária e policial, transformando todos os cidadãos em suspeitos potenciais. Ao mesmo tempo, há novos projetos de lei que visam estabelecer franquias (limites) para a quantidade de dados trafegados no uso da internet, transformando a internet numa grande central telefônica.

Ambos os projetos subvertem princípios fundadores do funcionamento da Internet tal qual a conhecemos. E isso só é bom para quem quer ganhar muito dinheiro com ela ou para quem quer controlar a liberdade de expressão e conhecimento. Para que a internet possa ser um ambiente mais próximo de um espaço público, com direito à livre circulação, expressão e acesso à informação, ela não pode funcionar como uma zona militarizada onde precisamos apresentar nosso CPF pra qualquer clic; nem muito menos operar como uma chamada telefônica onde precisamos contabilizar os minutos que permanecemos assistindo um video ou quantos textos leio na rede. Já imaginaram como será o uso que faremos da internet sob essas condições?

Faço ainda outro alerta. A possibilidade de tarifação da Internet com franquia de dados, visa preparar e acostumar o internauta para a próxima geração tecnológica de transmissão de dados por radiofrequência: do Wifi para o LTE[1]. Com esta combinação, a Internet estará morta e enterrada.

O momento exige a formação de um amplo movimento social (que não seja restrito às organizações civis especializadas nessa temática), para que possamos resistir e criar alternativas ao desmonte da Internet. Ao mesmo tempo: #internetlivre e #bandalargaparatodos, para democratizar o direito à comunicação e ao conhecimento, contra o estado de exceção e o vigilantismo; contra o controle corporativo de nossas comunicações.
Criemos #redesdaliberdade

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[1] sobre as atuais disputas entre padrões tecnológicos no IEEE-802 veja a tese de doutorado de Diego Vicentin

fonte imagem: http://outraspalavras.net/outrasmidias/wp-content/uploads/2013/07/Liberdade-na-Internet.jpg

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Na próxima terça-feira (12/4) pode ser votado o relatório da CPI sobre Cibercrimes. Diversas organizações sociais e pesquisadores (do Brasil e do exterior), já manifestaram sua preocupação com as propostas presentes neste relatório e o impacto negativo que ele terá sobre a Internet e, consequentemente, diversos aspectos da nossa vida social offline.

Participei ontem de uma entrevista no programa Brasilianas com o jornalista Luis Nassif e outras pesquisadores do tema: Marília Maciel do CTS-FGV e Ana Claudia Silva Mielke do Intervozes. O programa deve ir ao ar na próxima segunda-feira (11/4).

Durante a semana, além da leitura do relatório da CPI-Cibercrime e dos diversos materiais compilados sobre o tema (selecionados abaixo), com especial destaque para o documento crítico elaborado pela Coding Rights e IBIDEM, tive também que reler um texto do M.Foucault (Em defesa da sociedade) e outro do G.Deleuze (Sociedade de Controle) em razão de um curso que estou participando.

Foi uma combinação de leituras explosiva. Meus amigos, não se iludam. A Internet tal qual a conhecemos na segunda metade dos anos 90 está profundamente corrompida. Se não tomarmos medidas coletivas para fortalecer a liberdade na rede, a privacidade e o direito à navegação anônima (da mesma forma como caminhamos com nossos pensamentos silenciosos pela rua), se não controlarmos a expansão infinita da coleta, tratamento e comercialização de nossos dados pessoais (por empresas e governos), a sociedade policial estará plenamente implantada entre nós. Pior, com todos os cidadãos convertidos em suspeitos permanentes, criminosos em potencial, e ao mesmo tempo policiais de nós mesmos e de todos à nossa volta.

Por fim, só restam 6 dias para contribuir para a vaquinha digital da Cryptorave, iniciativa fundamental para a disseminação da cultura, práticas e tecnologias que promovem a liberdade de expressão, a privacidade e o modelo de segurança informática que queremos. É agora: https://www.catarse.me/cryptorave2016

Seleção de links sobre a CPI-Cibercrimes (contribuições colhidas na lista Antivigilancia e Lavits)

Relatório final da CPICIBER

http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1447125&filename=Tramitacao-RCP+10/2015

Nota técnica realizada por Coding Rights e Ibidem, com mais várias organizações signatárias:
https://cpiciber.codingrights.org/sumario-executivo/
https://cpiciber.codingrights.org/CPICIBER_NotaParaParlamentares.pdf

Manifestação do Comitê Gestor da Internet no Brasil: http://www.cgi.br/esclarecimento/nota-de-esclarecimento-em-razao-do-relatorio-da-cpi-crimes-ciberneticos/

Abaixo-assinados:

http://internet-governance.fgv.br/abaixo-assinado-cpi-de-crimes-ciberneticos
https://www.change.org/p/congresso-nacional-congresso-nacional-diga-n%C3%A3o-%C3%A0-censura-da-internet-n%C3%B3s-defendemos-a-liberdade-na-internet

 

Reportagens:
http://blogdosakamoto.blogosfera.uol.com.br/2016/04/04/cpi-do-congresso-nacional-propoe-censurar-a-internet/
https://www.nexojornal.com.br/expresso/2016/04/01/Por-que-a-conclus%C3%A3o-da-CPI-dos-Crimes-Cibern%C3%A9ticos-levanta-o-temor-de-censura
https://antivigilancia.org/pt/2016/03/8-pls-sao-propostos-pelo-relatorio-final-da-cpi-de-crimes-ciberneticos/
http://www.brasilpost.com.br/2016/04/04/censura-cpi-crimes-ciberneticos_n_9610006.htmlhttp://apublica.org/2016/04/truco-cpi-ameaca-direitos-dos-internautas/http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/CIENCIA-E-TECNOLOGIA/506618-RELATOR-DA-CPI-DE-CRIMES-CIBERNETICOS-EXCLUI-PONTO-POLEMICO-DO-RELATORIO.html

Atualização:

08/04: http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/CIENCIA-E-TECNOLOGIA/506618-RELATOR-DA-CPI-DE-CRIMES-CIBERNETICOS-EXCLUI-PONTO-POLEMICO-DO-RELATORIO.html

O relatório novo, com as mudanças que já foram propostas e incorporadas pode ser publicado aqui:
http://www.camara.leg.br/sileg/Prop_listaComissao.asp?codComissao=537731

 

Durante o Simpósio LAVITS – Territórios, Tecnopolíticas e Vigilância, realizado no Rio de Janeiro em maio de 2015, travamos discussões instigantes sobre a transformações nas formas de regulação das fronteiras entre o publico e privado nas relações mediadas pelas tecnologias digitais, as novas formas de controle e vigilância, e muitas outras coisas.

Em uma das sessões temáticas – “Dados pessoais: proteção, prospecção, controvérsias” – provocado pelos trabalhos apresentados, lancei a reflexão descrita abaixo aos colegas Rafael Evangelista, Miguel Said e Jorge Machado. A idéia não é nova. Depois, o Márcio Ribeiro retomou a conversa no Twitter – https://twitter.com/marciomoretto/status/600383786988220416 . Agora, continuo discutindo por aqui.

***

E se, ao invés de pensarmos a regulação da privacidade em meios digitais apenas em termos de nossos direitos individuais passássemos a abordá-la como um bem comum (commons), um recurso cujo usufruto depende de direitos coletivos e de uma gestão compartilhada, da mesma forma como o ar que respiramos e a água que bebemos?

Em primeiro lugar é preciso dizer que parto de uma noção “relacional” ou “contextual” de privacidade. Entendo-a como a capacidade que um indivíduo têm de determinar quais aspectos de sua vida serão ou não conhecidas por outros. Em termos práticos, estou tomando a noção de privacidade como a capacidade de delimitar a fronteira entre aspectos privados e públicos de nossa existência.

Quando coloco informações sobre minha vida íntima num ambiente de fácil leitura (como uma rede social online), considero que aquelas informações não ameaçam a minha privacidade. Ou seja, balizamos nossa percepção sobre nossa privacidade em função de expectativas relativas à capacidade dos outros respeitaram a fronteira que tenho estabelecido entre meu universo público ou privado.

Em cada ambiente, em cada meio de comunicação que utilizamos, em cada interação social essa fronteira é estabelecida de maneira diferente. O surgimento de novas tecnologias (de comunicação ou de visualização) modifica radicalmente essas fronteiras. Sempre que surge uma nova tecnologia de comunicação somos surpreendidos em algum aspecto de nossas práticas culturalmente estabelecidas.

Por exemplo, atender o telefone e falar na presença de outros, como hoje fazemos com o celular na rua, no ônibus, em qualquer lugar, exigiu mudanças significativas em nossa percepção sobre a privacidade. Outro exemplo: quando estou dentro do meu apartamento considero que as paredes são sólidas o suficiente para proteger minha privacidade do olhar do prédio da frente. Todavia, se o vizinho utilizar uma sofisticada câmera de leitura térmica poderá visualizar minha atividade dentro do meu apartamento. Agora com os drones que estão se popularizando, muitas pessoas estão utilizando essas pequenas aeronaves para vasculhar e monitorar o espaço e a vida alheia.

Mas nesses casos, estamos falando de uma “invasão” ativa da privacidade de alguém. Ou seja, o controle que eu tinha sobre os contornos que fazem a fronteira da minha privacidade foram ultrapassados por terceiros. Mas em se tratando de nossa comunicação ou interação através das tecnologias digitais em redes cibernéticas, o problema muda de figura. Como conhecemos pouco sobre o funcionamento desses dispositivos ignoramos as profundas transformações em jogo e suas consequências.

Quando nos comunicamos com nossos computadores, celulares/smartphones, seja para acessar um site qualquer, para falar com alguém etc, é necessário que haja um “aperto de mãos” entre nossas máquinas e aquelas que acessamos. Nossos dispositivos estão em contato, trocam dados, se “reconhecem” para que a comunicação funcione. Muitas das tecnologias que foram primeiramente desenhadas para funcionar na internet não levaram em conta essa situação que hoje temos pelo frente. Enquanto algumas dessas tecnologias são “protetoras” da privacidade por design (privacy by design/default), outras são altamente permissivas.

O fato é que hoje, a capacidade que temos de regular as condições de privacidade em nossa comunicação em meios digitais escapa, em certa medida, ao nosso poder. Nesse sentido, ainda que eu seja cauteloso com minha privacidade online, eu posso ser surpreendido pelas configurações de algum serviço ou site, por não entender ou por não ter tido acesso à forma como aquele site/serviço/dispositivo gerencia as informações que lhe forneço para utilizá-lo.

É neste sentido que fiquei pensando se podíamos fazer uma analogia entre a privacidade e os bens comuns, cujo usufruto depende do respeito e gestão coletiva sobre ele; recursos cuja titularidade jurídica é difusa, como o meio ambiente por exemplo. Quais as implicações disso? Como seria a regulação sobre a gestão de nossos dados pessoais em meios digitais nesta perspectiva? Enfim…a conversa segue. Como combinar os aspectos técnicos (protocolos técnicos) com aspectos jurídicos (protocolos sociais) em que a proteção à privacidade seja promovida à recurso comum e responsabilidade coletiva?